IPI, DILMA E O PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL

O sistema constitucional tributário é o conjunto de normas constitucionais que regem a atividade tributária. É complementado, ou melhor, integrado por um conjunto de normas infraconstitucionais; as quais, em seu conjunto, formam o sistema nacional tributário.
Desse modo, como sistema, como explica Regina Helena Costa[1], a partir dos ensinamentos de Roque Antonio Carraza, temos:

Para Roque Carraza, sistema é a “reunião ordenada de várias partes que formam um todo, de tal sorte que elas se sustentam mutuamente e as últimas explicam-se pelas primeiras. As que dão razão às outras chama-se princípios, e o sistema é tanto mais perfeito quanto em menor número existam”.
Assim, por sistema tributário nacional entende-se, singelamente, o conjunto de normas constitucionais e infraconstitucionais que disciplinam a atividade tributante.

Uma interpretação sistemática do texto constitucional leva a crer que a anterioridade nonagesimal, que após a E.C. nº 42/2003, se aplica ao IPI, por força do artigo 150, III, c, da Constituição Federal, deverá ocorrer, mesmo quando a majoração desse imposto, ou mesmo outros, dentro do permissivo constitucional, dar-se por decreto.
A argumentação, em suma, é que o decreto integra a lei, dando-lhe efetividade, de modo que a majoração do tributo, com fundamento no artigo 153, §1º, da Constituição Federal, deverá respeitar o princípio da anterioridade nonagesimal.
Obter dictum, o Princípio da Anterioridade Nonagesimal trata-se, como reafirmado pelo STF, de direito fundamental, que deverá ser respeitado, não podendo ser mutilado pelo Poder Constituinte Derivado, ou pelo poder regulatório do IPI.
É a conclusão do STF, conforme o presente informativo.
Assim:

Informativo STF

Brasília, 17 a 21 de outubro de 2011 - Nº 645.

Majoração de alíquota de IPI e princípio da anterioridade nonagesimal - 1

O Plenário deferiu pedido de medida liminar em ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada pelo partido político Democratas - DEM, para suspender o art. 16 do Decreto 7.567/2011, que confere vigência imediata à alteração da Tabela de Incidência do IPI - TIPI, na qual se majoraram alíquotas sobre operações envolvendo veículos automotores (“Art. 16. Esse Decreto entra em vigor na data de sua publicação”). Consignou-se que a reforma tributária promovida pelo constituinte derivado, com a promulgação da Emenda Constitucional 42/2003, alargara o âmbito de proteção dos contribuintes e estabelecera nova restrição ao poder de tributar da União, dos Estados-membros e dos Municípios. Aduziu-se que fora acrescentada a alínea c ao inciso III do art. 150 da CF, com ampliação da incidência do princípio da anterioridade nonagesimal, antes restrita à cobrança das contribuições sociais (CF, art. 195, § 6º). No tocante ao IPI, o tratamento teria sido singular. Na redação conferida ao art. 150, § 1º, da CF, continuara o imposto excepcionado da incidência do princípio da anterioridade anual, mas não da anterioridade nonagesimal. [“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: ... III - cobrar tributos: ... b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou; c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; ... § 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I. ... Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre: ... IV - produtos industrializados; ... § 1º - É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V”].
ADI 4661 MC/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 20.10.2011. (ADI-4661)
Majoração de alíquota de IPI e princípio da anterioridade nonagesimal - 2

Asseverou-se que o princípio da anterioridade representaria garantia constitucional estabelecida em favor do contribuinte perante o Poder Público, norma voltada a preservar a segurança e a possibilitar um mínimo de previsibilidade às relações jurídico-tributárias. Mencionou-se que o referido princípio destinar-se-ia a assegurar o transcurso de lapso temporal razoável a fim de que o contribuinte pudesse elaborar novo planejamento e adequar-se à realidade tributária mais gravosa. Assim, o art. 16 do Decreto 7.567/2011, ao prever a imediata entrada em vigor de norma que implicara aumento da alíquota de IPI contrariara o art. 150, III, c, da CF. Deste modo, a possibilidade de acréscimo da alíquota do IPI mediante ato do Poder Executivo, em exceção ao princípio da legalidade (CF, art. 153, § 1º), não afastaria a necessidade de observância ao postulado da anterioridade nonagesimal. Por revelar garantia do contribuinte contra o poder de tributar, esse princípio somente poderia ser mitigado mediante disposição constitucional expressa, o que não ocorreria em relação ao IPI.
ADI 4661 MC/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 20.10.2011. (ADI-4661)
Majoração de alíquota de IPI e princípio da anterioridade nonagesimal - 3

Reputou-se que a Constituição deveria ser interpretada de forma sistemática. Dessa maneira, o permissivo por meio do qual se autorizaria o uso de ato infralegal para a modificação da alíquota não conferiria ao Executivo poderes mais amplos do que os atribuídos ao Congresso Nacional, até mesmo porque, nos termos do art. 153, § 1º, da CF, os poderes seriam exercidos nas condições e limites estabelecidos em lei. Apesar do inegável aspecto extrafiscal do IPI, a atividade do contribuinte seria desenvolvida levando em conta a tributação existente em dado momento, motivo pelo qual a majoração do tributo, ainda mais quando poderia efetivar-se em até trinta pontos percentuais, deveria obedecer aos postulados da segurança jurídica e da não-surpresa. Os Ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cezar Peluso, Presidente, destacaram que o princípio da anterioridade nonagesimal constituiria direito fundamental deslocado do art. 5º da CF, destinado a salvaguardar o contribuinte do arbítrio destrutivo ou dos excessos gravosos do Estado. Dessa forma, nem mesmo o Poder Constituinte derivado poderia mutilá-lo e, muito menos, extingui-lo. Por fim, deliberou-se conferir efeitos ex tunc à medida liminar. Vencido, nesta parte, o relator, que atribuía efeitos ex nunc à decisão.
ADI 4661 MC/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 20.10.2011. (ADI-4661)

REFERÊNCIA:

COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009.
Informativo do STF, Informativo nº 645, disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo.htm#Voto%20secreto%20e%20art.%205º%20da%20Lei%2012.034/2009%20-%201, acesso em 27. 10. 2011.


[1] (COSTA, 2009, p. 33),

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