A FILOSOFIA DA ADÚLTERA E OUTROS PONDÉS
O processo catártico de
mergulhar em um turbilhão de sensações sem explicação racional, e que, por
serem sem expressão semântica, atormentam-nos de forma (tão) percuciente.
Se por permanecerem sem
explicação, e por conta dessa condição, não se conseguir dar vazão a essa
miríade de significações (sem sentido aparente), ser a causa de tanto incômodo,
não sabemos ao certo.
Às vezes, a expressão
dessa conjunção desconexa de argumentos válidos em projetos de vida incoerentes
se mostra em uma imagem pretensamente íntima, que se apresenta, geralmente ao
fim da tarde. O conjunto de silhuetas que perfaz a linha do horizonte dessa
cidade. Quando o sol já se pôs, e a luz se dissipa, pouco a pouco, no dourado
ausente do começo da noite. Na intersecção desses dois mundos, ente o claro e o
escuro, um terceiro mundo se revela, na presença quase ausente da luz. Nesse
breve momento, tem-se a dimensão do que é aceitar existir no mundo, e não
fugir... (LEVY, 2001, p. 147).
A representação dessa
solitária agonia se mostra na expressão de algumas manifestações artísticas. Ao
menos para nós.
De um ponto de vista
totalmente subjetivo, (certas) sensações que emanam dessas canções, citações e
imagens; ligam-se às (outras) sensações (íntimas) inexpressivas, para nossa
consciência; e por meio da consciência estética de outros; eles, os artistas, presenteiam-nos
com uma forma de trânsito a todas essas sensações, significativamente
angustiantes e maravilhosas para fora de nosso ser.
O no sense completo da vida! Lembro agora de Goffredo Telles Júnior,
quando nos falava do Kaus e do Kosmos. Mas, sobretudo, a apreciação
estética do mundo, que nos fala Luiz Felipe Pondé. Diz ele, daquele filme
francês, o Selvagem, em que o perfumista, ao romper o ciclo de desgosto de sua
vida, ganha Catherine Deneuve como mulher, ao ter a coragem de olhar a vida
como ela é e não se enganar, e enganar os outros. Mais Nelson Rodrigues que
isso, impossível! (PONDÉ, 2013, passim).
Um sonho a mais (ao
escutar Erasmo Carlos - Minha Superstar)! (Como) aquela personagem que sai da
tela do cinema, em The Purple Rose of
Cairo. (Não) negar a grande vocação do cinema como porta de saída de um
mundo carregado de incompreensão, e de uma vida plena de desencontros. Como (não)
deixar de romper a quarta parede?
Muito próprio isso tudo,
por (se) ter ouvidos: Let the mistery be,
(como na música do Incognito).
Como é doloroso ter
presente, de forma (tão) absolutamente verdadeira, que somente uma filosofia
selvagem, do selvagem filósofo Nelson Rodrigues, tem a coragem de se dar ao
luxo de dizer a vida como ela é (PONDÉ, 2013, passim).
Verdade maior.
Percebe-se que gostamos muito de João Guimarães Rosa...Outra história de Belo
Horizonte. Coisa de cantar baixinho Belchior (Paralelas), na cobertura do Hotel,
sob um belo horizonte, tarde da tarde. Quase noite (sem lua).
Dizemos, também, por
estarmos muito identificados com Pondé. (Não) pretendemos ser entendidos por
ninguém. Somente oferecemos o que temos para dar. Nada mais, nada menos. Não temos
causas... Nem respostas. Somente lembranças e algumas referências.
Por estarmos aprendendo
a morrer, por tabela, aprendemos a envelhecer. Cada vez mais. Agora, (de) daqui
por diante, temos claro, ao lermos esse livro do Pondé, como ele nos diz, que
se trata disso mesmo: “envelhecer em paz, perder tudo, começando pelo corpo e
pela alma” (PONDÉ, 2013, passim).
Por sermos covardes,
nada se compara a meditar sobre nossos pecados, pela sensação estética libertadora
da arte. Valendo-nos da personificação da beleza, a confortar o desassossego
(bem Fernando Pessoa), de nos depararmos, por vários momentos ao dia, com a
constatação da precariedade da vida e da inexorável falibilidade de todos os
bem construídos conceitos (in)falíveis e os projetos imagéticos de felicidade
plena (bem Schopenhauer).
REFERÊNCIAS
LÉVY,
Pierre. O que é o Virtual? 2ª ed.
São Paulo: Editora 34, 2011.
PONDÉ,
Luiz Felipe. A Filosofia da Adúltera. São
Paulo: Leya, 2013.
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