A SIGNIFICAÇÃO SEMÂNTICA DO ESQUECIMENTO AMOROSO











“Nada é tão enviesado como a significação semântica do esquecimento amoroso”. Ela lhe disse. Assim, de chofre, guturalmente, como um soco na boca do estomago.
Ele num tom sussurrante, tentando defender sua virilidade colapsada: “Não! A reta razão que me impele a uma resposta, não diz respeito a sua pergunta”. Redarguiu, brandindo um misto de filosofia e ironia.
Tarde lá fora e dentro dela. Ela que pensava simbolicamente. Ela que sofria de uma dor impossível de ser verbalizada. Tinha a derradeira impressão do desassossego.
Ele ferido na alma. Ele que ainda sonhava em ser feliz. Ele que sofria de mal de amor. Tinha a derradeira impressão do desassossego.
Ele sussurrou qualquer coisa que ela já não podia mais compreender. “Porque tudo é tão obscuro e doloroso?” Sua mente perguntava a sua consciência.
Alheio a tudo e a todos, a tarde caia. Revoavam, na praça em frente, pássaros urbanos. Muitos iam e viam, em frente à praça recôndita, entre as casas antigas e desbotadas que já há muito não podiam pertencer a esse lugar, mas que insistiam em lá permanecer.
“A significação do chapéu coco para Sabina e Thomas, em Milan Kundera”. Pensava, ela, agora. “Quem saberá, além daqueles que compreenderam o livro?”.
Um rio semântico misterioso passava ao largo dos ignorantes (da significação do livro de Milan Kundera). E o leito desse rio dividia agora, de forma definitiva, os dois amantes.
Como na poesia, claro estava a ela o momento do desencontro. De repente não mais que de repente, ele se fez um completo estranho a ela.
Ela que por não mais se reconhecer ali, na significação do par feminino do casal, em profunda catarse, teve revelada a consciência abrupta de si mesmo.
Por um suspiro contido, enrubesceu, e seus olhos arderam, enquanto olhava em direção às torres da igreja. O sol já se escondera. Tarde, quase noite.
Quando o sino da igreja da praça anunciou seis horas, fez-se o momento da separação. Que por derradeira, na consciência dela, era, para ele, inesperada. Não percebera, por ser muito sutil, que ela não mais amava, por ter descoberto uma significação nova de amor. Significação que passava ao largo de sua percepção. Nada disse quando ela olhou para ele, profundamente e pela última vez.
A significação do olhar que ela lançou para ele estava além da expressão morfológica ou semântica. Sabia disso. Não havia o que ser dito. Por tal razão, nada disse.
Para ela. Um suspiro contido foi o que restou de tudo o que viveram e poderiam viver juntos. Morta a consciência da possibilidade da felicidade partilhada pelo casal, ela compreendeu que era melhor seguir sozinha, porque daqui por diante, nada mais restava que permanecer nesse estado de consciência.
A retórica da consciência é massacrante e definitiva. Ao se deparar com a verdade, nada mais nos resta que seguir a direção que ela aponta.
Afinal, se uma epifania serve para manifestar um deslumbre da paixão romântica, tanto mais se prestará à constatação de uma desilusão amorosa.
Se o discurso é o que faz do homem um animal político, que se poderá dizer da mulher no campo amoroso?
Finalmente caiu a noite. A praça ficou vazia e não mais se viam os amantes.


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